quarta-feira, 19 de agosto de 2015

PAIXÃO DOENTIA


          O que é a paixão? Uma fera solta na selva da vida que devemos enfrentar com unhas, dentes e riscos? Ou negar a paixão seria a grande isca para a fúria do animal selvagem que habita o fundo da alma humana? 
          Henry James, escritor norte-americano que se tornou inglês vitoriano, trabalha essas questões em sua novela de oitenta páginas A Fera na Selva. E, em tão curto espaço, deixa-me perplexo com sua intuição, talento, capacidade criadora, além da profunda análise psicológica que antecipa e ultrapassa Freud.
          A Fera na Selva é um mergulho na complexidade da consciência que foge a regras, estudos e convenções. Trata do relacionamento de John Marcher e May Bartram, um casal inglês marcado desde a juventude pela impressão de que algo raro e estranho, ao mesmo tempo prodigioso e terrível, aconteceria a John, e ambos transformam essa premonição em motivação para a vida. Aguardar o evento extraordinário, que aparentemente nunca chega, marca o relacionamento de John e May. Esperam Godot com meio século de antecedência.
          John é extremamente egoísta. Ela se mostra algo simplória, porém, ao final da vida, atina que o grande evento havia ocorrido e reza para que o companheiro não o descubra, pois a revelação lhe abalaria a sanidade. Ao lado do túmulo de May, John acaba inferindo a verdade, final e absoluta: o vazio. Com esse enredo, singelo à primeira vista, Henry James tece uma trama envolvente, refinada, perspicaz, densa, que prende a atenção.
          Deve-se viver ou evitar a paixão? Para Henry James, ela vale a pena. Concordo. Uma boa paixão nos garante a vida. Nem que seja por um dia. O resto fica para a insanidade.      


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