domingo, 31 de maio de 2015

Três pesquisadores que experimentaram quase todas as drogas

         Você já ouviu falar do oliliuqui? E do peyote? E da ayhuasca ou yagé? E da folha divina da imortalidade? Pois todos esses nomes se referem a plantas alucinógenas usadas pelos índios da América Latina para entrar em contato com seu universo interior ou com seus deuses. Para pesquisá-las, três gerações de botânicos da Universidade de Harvard percorreram nosso continente, enfrentaram todo tipo de perigo e doença. Descobriram como essas drogas atuam. Para retratá-las com precisão, eles experimentaram quase todas e relataram os efeitos sobre seus corpos e mentes. Um barato que, às vezes, saiu caro.
          Essa aventura louca, que põe Indiana Jones no chinelo, aparece no livro El Rio, de Wade Davis, etnobotânico e documentarista canadense. El Rio, ou One River no original, infelizmente não foi traduzido para o português, mas merece. É ótima leitura. Além de resgatar as aventuras de Richard Schultes, Tim Plowman e do próprio Wade Davis nas selvas, também realiza amplo levantamento da cultura e da história de países latinos e de tribos indígenas. Por exemplo, ao mergulhar no ciclo da borracha, descreve o apogeu de Manaus, quando os perdulários milionários da cidade, para ter seus lençóis bem branquinhos, mandavam lavá-los na Europa. Lembra como as sementes de nossa seringueira foram contrabandeadas para a Ásia e como os norte-americanos fazem biopirataria usando o nome da ciência. Conta como tribos inteiras foram chacinadas pelos europeus, sobretudo espanhóis. Ao todo, quase 30 milhões de pessoas.
          Mostra, ainda, outro tipo de extermínio, perpetrado por religiosos que, em nome da salvação, dizimaram muitos povos e suas culturas. Revela que dois presidentes dos Estados Unidos, vários artistas e Freud se tornaram consumidores de coca. O papa Leão XIII até condecorou o inventor de uma bebida, o Vinho Mariani, feito com a planta. Aliás, a coca é, até hoje, importada legalmente nos Estados Unidos pela Stepan Chemical Company, empresa que repassa um de seus extratos para a Coca-Cola, originalmente um remédio vendido em farmácia como vinho francês de coca. O que mudou?

          Tudo isso e muito mais você encontra em El Rio ou One River, de Wade Davis. Livro delicioso, apaixonado, apaixonante, imperdível. Se tiver oportunidade de lê-lo, faça-o. Você não sairá ileso das águas desse rio.   

sexta-feira, 29 de maio de 2015

Os amantes de Verona

 Em 1596, a juventude inglesa chorava o infortúnio de Romeu Montecchio e Giulietta Capuleto, o casal apaixonado de Verona que sucumbiu a intrigas familiares e acabou cometendo suicídio. Christopher, um adolescente de Stratford-on-Avon, inconformado com o desfecho, decidiu reescrever a história, evitando a tragédia: os amantes se salvariam e seriam felizes para sempre.
Ao mergulhar na escrita, criou uma Julieta tão bela que não resistiu a seus encantos e se apaixonou pela criatura. Desejou-a durante meses, mais próxima a cada palavra, mais palpável a cada parágrafo, mais sua a cada capítulo. Em intensidade cada vez maior, percebeu-lhe o aveludado do rosto, enquanto a acariciava na pele do papel. Ao luar, sentiu o perfume de seu hálito de mel nos versos que compunha. Na cama, desnudou-a com o carinho que a tinta conferiu ao corpo imaginado. Autor e personagem se mesclaram até que a fronteira entre eles ruiu. Enlouquecido, Christopher resolveu conquistar em definitivo a veronense. Abandonou Stratford e desapareceu dentro da obra.
Uma pessoa descobriu seu paradeiro. William, amigo e confidente, leu as páginas já escritas, ligou o fato à ficção e entendeu o sumiço. Para comprovar, acrescentou algumas frases ao texto em andamento e pediu notícias. A resposta brotou nas linhas seguintes, saindo do vazio, letra a letra.
Christopher cumprimentou William pela perspicácia, exigiu segredo a respeito do plano, contou suas andanças por Verona, revelou que já mantinha contato com a jovem Capuleto, na realidade muito mais bela do que supunha. Ela correspondia à corte, embora desconfiasse que talvez tentasse usá-lo para provocar ciúme em Romeu. Desse dia em diante, sucederam-se quatro capítulos sobre a evolução da conquista. 
De repente, a reviravolta. Christopher, no meio da narrativa, enviou uma mensagem de desespero:
“Tire-me daqui, William. Eles vão me matar.”
Enquanto as palavras secavam, William não soube o que fazer. A folha retorceu, cresceu para os lados, ocupou o piso e, das letras, materializou-se um corpo com dois punhais cravados às costas. William, num tardio gesto de ajuda a Christopher, removeu as lâminas ensanguentadas. Ao arrancá-las, notou as iniciais gravadas em cada cabo: no mais trabalhado, coberto com cristal rosa, GC; no outro, com uma esmeralda bem corada, RM.
William assumiu o lugar do morto e continuou a escrever a história. Em vingança pelo amigo, quando os amantes de Verona pareciam a um passo do sucesso, não os poupou do encontro com o destino.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

O assassinato de uma casa e de seus habitantes

       Pode uma casa ter vida, crescer e morrer como uma pessoa? Se você ler o romance Crônica da Casa Assassinada, do escritor mineiro Lúcio Cardoso, a resposta é sim. Sim, pode. E com que maestria a casa morre, acompanhando a decadência de seus moradores, uma família do interior mineiro, os Meneses. Numa mistura de surrealismo, densidade de texto e introspecção psicológica, trabalhadas em linguagem que muitas vezes beira a poesia, Lúcio Cardoso joga-nos dentro de uma fazenda que guarda segredos terríveis entre os parentes e os agregados que a habitam, lado a lado, nos quartos ao longo de um corredor espremido entre a sala e a cozinha.
          Incesto, morbidez, adultério, pesadelo e violência entrecruzam-se de maneira velada, sutil, expressos em diários, cartas e confissões, a partir da chegada da desconhecida Nina, mulher bonita, manipuladora e extravagante que deixa o Rio de Janeiro para casar-se com um dos Meneses, atraída e traída pela aparente riqueza da família. Nina desperta paixão e inveja nos outros moradores. A tensão aumenta. Um aparente incesto acontece. Relatos de testemunhas adicionam lenha à fogueira. O embate entre os personagens gera reações que vão da febre amorosa ao ódio, da indiferença à mentira.
      Haja criatividade para manter o texto num nível tão elevado, belo e angustiante. A casa é um complexo caso psicanalítico, sem saída, cujo destino se superpõe ao de Nina, carcomida pelo câncer e suas metástases.

          O romance foi publicado em 1959. Faz, portanto, cinquenta e seis anos que a obra encanta. Continua magnífica a Crônica da Casa Assassinada. Um assassinato que nem Freud junto com Sherlock Holmes desvendariam.      

quarta-feira, 27 de maio de 2015

Brasas que nunca apagam

           Dizem que a vingança é um prato que se come frio. No entanto, esperar quarenta e um anos para fazer essa refeição não seria um prazo longo demais? Não é o que pensa o septuagenário general Henrik em relação a seu melhor amigo, Konrad. A amizade entre eles durante a juventude, quando frequentaram juntos a academia militar, tinha sido tão próxima que tangenciava o erotismo. Eram como gêmeos no útero materno. Depois de formados, trabalharam no quartel em Viena, até que Henrik conheceu Kriztina e se casou com ela. Durante uma caçada, o recém-casado, pelos sons e posição do amigo na mata, descobre que Konrad esteve para matá-lo. Horas depois, Konrad desaparece no mundo. Por quê?
          Ao montar as peças do quebra-cabeças, o general reconstrói os movimentos da esposa e do amigo, chega à conclusão fatal, refugia-se numa ala de seu castelo, nunca mais fala com Kriztina e aguarda o retorno de Konrad, que considera inevitável. Quarenta e um anos depois, quando há muito Kriztina tinha morrido, Konrad de fato volta. Henrik, que viveu para esse reencontro, está pronto para a vingança. Amor, amizade, honra, culpa, pudor, inflexibilidade ética e raciocínio lógico permeiam o desfecho.
          Se você deseja saber o que acontece aos dois amigos, precisa ler As Brasas, a fascinante novela do húngaro Sándor Márai. Guarde este nome, As Brasas, livro com menos de cento e setenta páginas no qual Sándor Márai esbanja talento na descrição de perfis psicológicos, costumes, cultura e ambientação durante os estertores do Império Austro-húngaro. A tessitura de mestre prende-nos a atenção, com revelações e surpresas página a página, em doses homeopáticas. A beleza da linguagem é mantida na tradução de Rosa Freire d’Aguiar.
          As Brasas queimam mesmo depois de virarem um quadro na parede.
             










terça-feira, 26 de maio de 2015

Desafio radical na neve - uma aventura

         Imagine uma cordilheira dentro de outra. Imagine dezenas de picos nevados com mais de cinco ou seis mil metros de altitude, reunidos num perímetro de 165 quilômetros. Essa cordilheira existe. Fica no meio dos Andes peruanos e se chama Huayhuash. Atravessá-la é um desafio radical. Num único dia, saí de uma densa mata de quenuales a três mil e quinhentos metros de altitude, cheguei à neve a cinco mil e dormi a quatro mil na puna andina. Encontrei por lá gente de trinta países, nenhum brasileiro.
          Huayhuash é uma aventura que marca não apenas pela beleza, também pela diversidade de clima, relevo, plantas e animais, pelos lagos cristalinos, pelo estrondo das avalanchas, pelo silêncio da noite, pela pureza do ar, pelo vento que arrasta e congela. Nem pense em ir, se você gosta de conforto. Barraca é o único hotel.
          Aliás, Huaywash tem o som, em inglês, de “why wash” ou “por que se lavar?”. Ao percorrer suas trilhas, o que demora doze dias, é difícil tomar banho. Os riachos que descem das geleiras não convidam para mergulhos. O risco de morrer de frio é real. Na única fonte termal que encontrei, ao pé de um vulcão, tive a companhia de uma nevasca que me roubou a coragem de sair do poço quentinho. Sempre que o céu se abria, montanhas com nomes sonoros e estranhos brilharam ao sol, brancas de doer: Yerupajá, Jirishanca, Ninashanca e Siula. O Siula, aliás, foi palco da façanha relatada no livro “Tocando o vazio”, prova da enorme capacidade de resistência do ser humano.
          Huaywash, de tão remota e selvagem, foi esconderijo do Sendero Luminoso, o famoso grupo guerrilheiro peruano. Sendero Luminoso, ou Caminho Luminoso, seria um nome apropriado para a cordilheira. Ali se veem todas as possíveis nuanças de luz, sobretudo aquela que, lá no alto, onde o ar rarefeito embevece o cérebro, parece brotar de dentro da gente e iluminar o presente, o passado e o futuro, revelando a imensa curtição de estar neste mundo. À luz de Huayhuash, a vida pulsa através de todos os tempos num único momento. Um eterno momento.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Um mago de outros mundos

        Já participei de seminários, palestras e congressos sobre Guimarães Rosa no Brasil, Inglaterra e Alemanha. A maioria dos trabalhos abordava Grande Sertão: Veredas, obra-prima do autor. O que faz Grande Sertão: Veredas tão estudado, tão sedutor, apesar de nunca ter caído no gosto popular?
          O romance é uma soma de tramas, invenções, reinterpretações e símbolos. Tramas, invenções, reinterpretações e símbolos linguísticos, geográficos, mitológicos, filosóficos, literários. Tudo bem combinado com talento, audácia e originalidade. Mistura de real e sobrenatural, de minúcias do sertão e lendas medievais, de linguagem cabocla e neologismos enraizados em diversas línguas, de honra masculina e homossexualidade, de vivência e psicanálise, de sutileza e violência, de amor e pecado, de deus com o diabo. Grande Sertão oferece uma orgia para os sentidos. Deste e de outros mundos.
          É difícil penetrar em seus meandros, emaranhados, veredas. Uma vez dentro do mundo rosiano, o prazer é intenso. A saga dos jagunços Riobaldo e Diadorim transcende o sertão e se faz humanidade. Minas Gerais vira um universo único, nascido no ventre de Rosa, morto com ele. Nós, leitores, ao final do livro, sentimos a epifania da arte, o intelecto transformador e o transformado, o êxtase da literatura.
          Sim, vale a pena desbravar o Grande Sertão. Há magia nele, há um mago por trás de suas páginas. Se Machado de Assis é o Bruxo do Cosme Velho, com carinho, merecimento e admiração Guimarães Rosa é o Bruxo de Cordisburgo. Bruxo dos bons, ao mesmo tempo mago e magia. Com direito a um caldeirão onde cabem línguas, filósofos, escritores, vidas e vivências que o mago devorou.

         

sábado, 23 de maio de 2015

Literatura não é ciência

        A teoria da literatura explora o modo de ser da obra literária, isto é, suas propriedades, sua diversidade, o processo de criação e recepção, as congruências e diferenças estruturais e históricas da literatura. Complicado? Eu acho que sim. Complicadíssimo.
          Fica ainda mais complicado quando se adicionam as várias correntes formadas a partir desses conceitos (como os positivistas, neopositivistas, estruturalistas, historicistas, semióticos, estéticos, hermenêuticos, intertextuais, indeterminados etc etc), cada corrente com seu ponto de vista, cada uma disposta a bombardear as oponentes. A confusão aumenta quando outros tentam transformar o estudo da literatura em ciência, ou seja, tentam amarrar a literatura a regras, princípios e uniformidades que não lhe são próprios.
          Escrever é um gesto caótico, em que o escritor muitas vezes não sabe aonde quer chegar, tampouco, na chegada, sabe se atingiu o objetivo. Como disseram os poetas, os versos são inúteis, uma inutilidade que transforma e seduz. O melhor a fazer é curtir a leitura, cada qual à sua maneira, pois há tantas maneiras de se perceber o texto tantos são os leitores. A literatura precedeu a ciência do caos.
          Outros alegarão, entretanto, que minha ideia faz parte de uma teoria desenvolvida no século 20, teoria que visa classificar os textos dentro de parâmetros que desembocaram na ciência da literatura. Confuso? Confusíssimo. Quando escrevo ou leio, não penso em teoria, em ciência. Penso na arte. No prazer. Na estética. No personagem. No enredo. Nas figuras de linguagem e na linguagem em si. Na sabedoria do autor. Na sonoridade. Na melhor palavra. Na imensa alegria de mergulhar em mundos que parecem, mas não são, ou são, mas não parecem ser. Nada disso precisa de ciência, apenas de sensibilidade. Sensibilidade para capturar a ficção da realidade. O mundo é a ficção de cada um. Escritores simplesmente falam da sua fantasia.    


quinta-feira, 21 de maio de 2015

Um bruxo bom para a cabeça

Quem não se sente meio sem inspiração de vez em quando, com os neurônios em recesso, o cérebro desligado? Sempre que termino de escrever um livro, caio nesse processo, sofro com a entressafra, acho que a fonte secou e nunca mais escreverei. Minha receita para sair do parafuso é ler. Leio muito. De tudo. Sobretudo releio autores favoritos.
Para turbinar a cabeça, ninguém melhor que Jorge Luis Borges. O bruxo argentino possui imaginação para dar e emprestar. Seu excesso de criatividade me excita, besunta as sinapses e restabelece o fluxo das ideias. Mergulho fundo nele, busco entendê-lo no momento da criação, encanto-me com os meandros de sua mente. Viajo na biblioteca sem fim de Babel, nos caminhos que se bifurcam em Almotásin, no Aleph que tudo contém, devoro as histórias da infâmia, admiro a erudição, pesquiso quais citações são verdadeiras ou inventadas, descubro nuances das quais não desconfiava, passeio até pelo fervor de Buenos Aires, renovo a impressão de que Borges, brilhante demais, conciso demais, tinha preguiça para escrever histórias longas, um romance por exemplo.
Aliás, essa impressão me foi confirmada por dois de seus amigos na capital argentina, onde certa vez, anos depois da morte de Borges, conheci um sósia seu, um senhor tão parecido que quase lhe pedi autógrafo. Admirador tem cada idiossincrasia...

Nesses dias em que começo a sair da entressafra, uma vez mais fico em débito com o bruxo portenho. Bela maneira de me curar ou, quem sabe, me adoecer de novo para a escrita. Ah se todo remédio fosse assim tão perfeito e gostoso. Pois passo a receita a todos. Se funcionar, passem adiante. Boa leitura não tem contraindicação. Nem fim. Como diria Borges, é um eterno retorno. 

terça-feira, 19 de maio de 2015

Receita milenar para virar herói

        A verdade é uma só, e os sábios falam dela sob vários nomes. Esta frase está nos Vedas, livros sagrados hindus. Tomemos, por exemplo, a trajetória dos heróis. Ela se repete em todos os continentes, sob os mais diversos nomes, desde a antiguidade: Gilgamesh, Moisés, Shiva, Rei Arthur, Joana D’Arc, Hércules, Jesus, Tiradentes. Esses heróis, depois de sofrer provações, trouxeram sabedoria ou renovação para sua gente. Aliás, entre as biografias de Jesus e Hércules existe mais que coincidência: ambos eram mortais e deuses, filhos de um todo-poderoso com uma terrena, passaram por sofrimentos atrozes, salvaram o mundo, sentiram-se abandonados pelo pai, depois da morte subiram aos céus. Até suas últimas frases teriam sido, em algumas tradições, as mesmíssimas, apenas separadas por muitos séculos.
          Quem quiser saber um pouco mais sobre o caminho comum aos heróis de todos os tempos não pode deixar de ler o livro A Jornada do Herói, baseado na vida e na obra do grande mitólogo norte-americano Joseph Campbell. Campbell afirma que uma nação sem mitos não é uma nação, apenas um amontoado de pessoas disparatadas. Estamos bem no Brasil. Mito sobra por aqui.
          O mito é o mistério do mundo, condicionado à cosmologia de cada época. Por isso, Campbell não via qualquer conflito entre a ciência e a religião, pois a religião é balizada pelo conhecimento existente na data de sua fundação. Não se pode comparar o conhecimento de hoje com aquele de dois mil anos atrás. A defasagem é evidente. O mito, então e hoje, busca o mistério, a mesma busca do herói que, ao se lançar nela, nos revela um pouco mais acerca do mundo e de nós mesmos.
          A receita para ser herói é simples, segundo Campbell: “Siga a sua bem-aventurança, vá aonde há um profundo sentido do seu ser, vá aonde seu corpo e alma querem ir”. Ao tomar essa trilha, escute sua voz interior, e as portas se abrirão.
Ouvimos essa mesma história todos os dias, repetida por empresários, artistas, políticos, atletas e cientistas que se esforçaram, tiveram sucesso e nos legaram coisas novas. Isso prova a permanência do mito. Através dos séculos, a jornada do herói não muda.   

sábado, 16 de maio de 2015

O dia em que escalei o letreiro de Hollywood

     Toda sociedade possui seus ritos de passagem, escancarados ou não. Quando reprimidos, os jovens os revigoram, pelo prazer de se testar, de se afirmar perante o grupo, de dizer ao mundo que chegaram à idade adulta. Darwin explica isso melhor que Freud.
     Em Los Angeles, há muitos anos, o supremo teste de coragem para um adolescente era escalar o letreiro de Hollywood, aquela marca na montanha que identifica a capital do cinema. Chegar ao topo de qualquer das nove letras garantia a admiração dos menos corajosos e o orgulho do escalador. A cidade guardava, como alerta, os nomes dos rapazes que, ao longo das gerações, despencaram e morreram ou ficaram aleijados.
     Havia algumas dicas importantes para os aventureiros. Como o letreiro era um símbolo da cidade, ele ficava sob guarda. No sábado à tarde ou no domingo de manhã, porém, os seguranças costumavam abandonar o serviço, já que ninguém é de ferro. Tampouco se podia acreditar nos enormes cartazes que ameaçavam processar com a severidade da lei quem ultrapassasse a cerca que delimitava o monumento. A cerca, aliás, tantos eram seus fios de arame farpado, também intimidava. Por último, precisava-se de uma corda, pois a escada de marinheiro que conduzia ao topo começava a uns dois metros do chão.
     Parti para a aventura com um colega de escola num sábado à tarde. Demos sorte. Como previsto, no meio do deserto que circunda a montanha, o segurança se sentiu seguro o bastante para sumir do serviço. Ultrapassada a cerca, a corda facilitou o início da escalada. Depois, grudados aos degraus da escada, fomos subindo rumo à glória. Bem rápido, para evitar sermos flagrados.
     Quase no fim da letra H, levei um escorregão ao trocar o pé e por pouco não caí. Altura de um prédio de seis andares, talvez sete. Segurei-me pelos braços, sem encontrar apoio para os pés. Embranqueci. Gelei. Tremi da cabeça ao mindinho. Fiquei com medo de prosseguir. Meu amigo me incentivou a continuar. Igual bicho-preguiça, fui em frente.
     Ao alcançar o topo, veio a decepção. A vista era horrorosa. Hollywood não passava de um amontoado de galpões de cinema no meio do deserto, uma ou outra palmeira a destoar da monotonia da planície. Ainda sob efeito da descarga de adrenalina, perguntei-me por que assumira tanto risco.
     De repente, ouvi o grito de vitória de meu amigo. Então me dei conta de que conseguira.Conseguira. Isso era o que importava. Também gritei. Escalar o H de Hollywood, por mais arriscado que fosse, por mais sem graça que pudesse ser a vista, tinha um valor simbólico. Um valor que não tem preço.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Tablets, foblets, goblets, goblins, gadgets e gente afobets

         Raramente um neologismo nos pegou com a força do tablet, essa varinha de condão que, com dois toques, coloca o mundo na palma de nossa mão. Tablet tornou-se arroz com feijão, graças a uma campanha de lançamento bem feita. Todas as mídias noticiaram a histeria consumista, alardeou-se até a escravidão em que os operários chineses seriam mantidos, para atender à surpreendente demanda. Ninguém questionou a exploração humana, todos queriam a geringonça, o novo gadget. O fenômeno se repete, ano após ano, a cada lançamento, a cada novo modelo que pouco muda.
        O Brasil aderiu ao modismo de corpo e alma. O governo ameaça, volta e meia, colocar o tablet na mochila de cada aluno da escola pública. Passa da hora. Os marqueteiros juram que, se você não comprar um, você vira ET. Por conta de seus gadgets, Steve Jobs perdeu todos os pecados e morreu santo e herói ecumênico. Enquanto isso, novas gerações de tablets chegam ao mercado, novas empresas os comercializam, novos nomes são inventados, surgem os foblets, muitos não vingam, todos se tornam goblets (Santo Graal para recolher dinheiro), as pessoas se sentem goblins quando não possuem o modelo mais atualizado.
          Já vi esse oba-oba antes. Muitas vezes. Aconteceu com tvs, vídeos, filmadoras, pcs, celulares, laptops etc. Desatento e induzido, comprei na afobação vários gadgets, completas inutilidades. Tenho pilhas de lixo eletrônico. Quanto ao tablet, todos possuirão um. Ele resolve problemas, inclusive o de carregar muitos livros numa viagem. Ainda mais agora que os modelos mais simples custam apenas 100 reais. Se funcionam, não sei, porém o preço comprova a tese de que logo todos terão um. Nem que seja para parecer moderno e deste mundo. Um mundo de neologismos e de quinquilharias digitais. Um mundo de gente afobets por gadgets que logo vão para o lixets.

quinta-feira, 14 de maio de 2015

Boeing em queda livre

O avião canadense decolou de Seoul, na Coreia do Sul, para Vancouver, no Canadá, às cinco da tarde. Quase trezentas pessoas a bordo. Minha mulher e eu ocupávamos a penúltima fileira, à frente de um simpático casal de portugueses. Quando íamos jantar, o piloto ordenou que aeromoças e passageiros se assentassem e afivelassem os cintos. Havia forte turbulência pela frente.
          O que se seguiu não foi turbulência, mas um rodeio de peão em cima de touro bravo. O Boeing 777 despencou sobre um colchão de ar duro, sofreu um baque, subiu, caiu, adernou à direita, estremeceu, subiu de novo. Então veio a queda livre. Sem fim. Depois de bater no fundo, pela janela vi o avião literalmente bater as asas para voar. Elas quase se dobravam e tocavam uma na outra. Moviam-se quais as de um pássaro ferido, prestes a entregar os pontos. Maleiros se abriram, objetos tombaram, garrafas caíram, vidros se espatifaram. Nesse momento, aconteceu o primeiro grito de pavor.
          Dizem que o pânico contagia. Sim, é verdade. Em questão de segundos, o avião inteiro berrava, uivava, gania, clamava aos céus. Parecíamos viver os últimos momentos. Olhei para minha mulher. Ela cruzara as mãos e, cabisbaixa, as apoiara entre as pernas. Brinquei, para espantar o medo:
          – Puxa, meu bem, nunca imaginei que iríamos morrer no meio do Pacífico...
          Seu olhar me queimou mais que fogueira da Inquisição.
          Durante outro mergulho sem fim, o português no banco de trás se rendeu ao terror:
          – Mariiiia, desta vez fomos!
          Não, não fomos. Novo baque, nova sobrevida, nova queda:
          – Mariiiiiiiiaaa, desta vez vaaaamos! Adeus, Mariiia!
          – Adeus, Manoel, amor meu!
          Olhei para o lado. Um garoto coreano rolava seu carrinho Matchbox sobre os assentos, alheio à balbúrdia, alheio ao medo, alheio até à mãe, que se descabelava.
          De repente, tudo acabou. Melhor dizendo, acabou a turbulência. Sobrevivemos. Vi o céu – o belo céu deste mundo em fim de tarde.

          Não consegui jantar. Meu assento ficava junto aos banheiros, a fila era enorme, e várias pessoas exalavam o mau cheiro de quem não se segurara. Havia manchas nos traseiros. Ninguém se sentiu constrangido. O preço era baixo para tanto alívio.            

terça-feira, 12 de maio de 2015

A porta geométrica da alma

        As seis conferências que Italo Calvino faria em Harvard em 1985, por sinal nunca apresentadas, devido à sua morte, deram origem ao pequeno livro chamado Seis Propostas para o Próximo Milênio. Calvino abordou as seis qualidades que considerava essenciais à boa literatura: leveza, rapidez, exatidão, visibilidade, multiplicidade e consistência. Não chegou a escrever sobre a consistência, acometido de letal hemorragia.
          Uma dessas qualidades me chama a atenção: a multiplicidade. Num mundo em que buracos negros, big bangs, genomas, retrovírus, neurônios, operações de swap e hedge, ipos e paradigmas frequentam nossas casas com a assiduidade da internet e da telenovela, a literatura não pode deixar de refletir sobre esses temas.
        A literatura retrata o tempo em que é produzida. Para melhor fixar sua época, o escritor precisa mergulhar até o pescoço nas crenças, crendices e fatos que o rodeiam, necessita absorver o máximo possível do espírito e da ciência em voga, deve processar tudo e tentar transmitir a outras gerações sua visão de mundo. Carece, portanto, tornar-se especialista em generalidade, ser um generalista assumido.
         Nosso século é único, diversificado, complexo, em rápida evolução. Embora enquanto seres humanos continuemos os mesmos, com as mesmas buscas e necessidades básicas de todas as gerações anteriores, o tempo foge, urge, ruge e avança. Como diz Calvino, o conhecimento nasce do embate entre a exatidão e a irracionalidade, entre a matemática e o caos. Exatidão, irracionalidade, matemática e caos são temas que só com multiplicidade o escritor consegue vislumbrar. A multiplicidade é a porta geométrica da alma. 

Palavras-chave: Calvino, Italo Calvino, Seis propostas para o próximo milênio, multiplicidade, literatura, big bang, swap, conhecimento, irracionalidade

 





segunda-feira, 11 de maio de 2015

Fé ao volante



          Sempre que vejo um carro cheio de amuletos, fitas, frases e adesivos protetores contra acidentes, eu me lembro de seu Divino, homem de muita fé. Ele deve ter sido um dos piores motoristas que já passaram pela Terra. Nunca entendi como conseguiu a carteira de habilitação. Morria de medo de estrada e de trânsito. Assustava-se com cada veículo que o ultrapassava: fugia, apavorado, para o acostamento, houvesse ou não acostamento. Dirigia a vinte por hora, o rosto colado ao volante. Derrubava a mureta da garagem duas vezes por semana. De vez em quando, caía dentro do mata-burro à entrada de sua fazenda. Um perigo, o seu Divino. Para ele e para os outros.
          Um dia resolveu, por precaução, escrever nas portas de sua velha Rural Willys uma quadrinha com rima bem rica, especialmente encomendada ao sacristão, para atrair as bênçãos celestiais:

           “O Pai na frente,
          A Mãe na guia,
          Livrai-nos de acidente,
          Jesus, José e Virgem Maria”.

          Virou chacota: de tão barbeiro, precisava da proteção da Sagrada Família inteira. Nem bem começou a desfilar o carro bento, bateu num barranco, capotou e caiu dentro de um córrego. Ao ser resgatado, disse que estava dando água para a tropa de cem cavalos do motor.
          Passado o susto, ficou ressabiado: por que os céus não o haviam protegido? Depois de muito pensar, descobriu a razão: não era lá muito devoto da Virgem Maria. Preferia outra santa, que considerava mais milagrosa. Para cortejá-la, raspou das portas o nome da Virgem e pintou ele mesmo, em garranchos, o da eleita:

          “O Pai na frente,
          A Mãe na guia,
          Livrai-nos de acidente,
          Jesus, José e Nossa Senhora Aparecida”.

          De nada adiantou lhe dizer que, além de perder a rima, havia trocado seis por meia dúzia. A mudança tampouco deu certo. Seu Divino continuou trombando e batendo, dia sim, dia não. Depois de quase destruir a Rural Willys numa focinhada de frente contra um caminhão, encostou-a na garagem, para o bem geral e alívio da família. Fé é fé, mas, ao volante, quem funciona mesmo é o motorista. Afinal, santo nunca tirou carteira de habilitação.

           
         Palavras-chave: motorista, barbeiro, acidente, carteira de habilitação, Rural Willys.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Como conquistar o mundo

        O chinês Sun Tzu faz sucesso dois mil e quinhentos anos depois de morto. Ele escreveu A Arte da Guerra, livro que deveria se chamar A Arte de Comer o Inimigo pelas Beiradas. Segundo Sun Tzu, a melhor batalha se vence sem disparar as armas, dobrando o oponente através da exibição de força e de organização. Em outras palavras, deve-se convencer o inimigo de que perderá a luta, caso ouse o enfrentamento. Esta é hoje a estratégia usada pela China em seu relacionamento com o exterior. Sua pujança e poderio inibem desafios. Tornou-se a economia da qual o mundo depende para crescer. Todos querem vender para eles. Os chineses tiram proveito da situação. Pragmatismo comercial.
          Sem disparos, também, foi a conquista dos Estados Unidos através do controle da maior arma do capitalismo: o capital. Com reservas em torno de quatro trilhões de dólares, os comunistas aterrorizam Washington quando insinuam que não mais comprarão papéis do Tesouro ianque. O dólar viraria pó, caso esse dinheiro fosse direcionado, por exemplo, para o ouro. Com tamanho trunfo na manga, Pequim adia para sempre a independência do Tibete e, aos poucos, reabocanha Taiwan. Ao mesmo tempo, adquire empresas e terra em vários países. Sem que percebamos, em muitas fábricas e fazendas no Ocidente, inclusive no Brasil, já se fala mandarim.
          Em outra estratégia de Sun Tzu, a China destrói os parques industriais de muitas nações, inundando-os com produtos baratos. Tentará ela, no futuro, quando detiver o monopólio de milhares de artigos, impor os preços que bem entender? Por que não?

          Santo de casa faz milagre, sim. Sun Tzu que o diga. Comendo pelas beiradas, ele vem ganhando a guerra para os chineses. Só com a estratégia. Sem um disparo. Por enquanto.            

quinta-feira, 7 de maio de 2015

A dor da infância

Literatura se faz com talento e sensibilidade. Talento para transmitir ideias e sensibilidade para capturar a complexidade do ser humano. Poucos autores realizam essa tarefa com a competência de Bartolomeu Campos de Queirós. Ele nos encanta, ainda, pela abordagem de sua própria vida, que transforma em prosa poética. Não é um escritor infantojuvenil, como costumam rotulá-lo. Nada disso. Talvez ele fale à criança que ainda habita em nós. Criança que talvez carregue memórias dolorosas da infância, com frequência obrigada a crescer à força e na marra, empurrada pela vida.
          Prova disso é seu livro Vermelho Amargo. Nele, vemos o menino sensível e observador retraçar os passos da paixão de uma família cuja mãe foi substituída por uma madrasta que possui ingredientes de conto de fadas: ela distribui pouco amor, pouco carinho, pouca atenção e até pouca comida. Um simples tomate sintetiza, com dramaticidade, a dor da perda. O pai alcoólatra pouco contribui para minorar a falta. Vermelho Amargo tem gosto de pouco, de falta.
          A dor profunda se mistura à memória numa linguagem que executa verdadeira sinfonia à língua portuguesa, à palavra precisa, à reflexão intensa. Tudo isso em setenta páginas de texto.
          Vermelho Amargo fala direto ao coração. E faz sashimi desse coração com uma faca de gume afiado, pronta para cortar fundo cada fibra de nossa sensibilidade. E serve o prato ainda com o sangue da memória bem quente, bem líquido, a escorrer diante dos olhos.        



quarta-feira, 6 de maio de 2015

Como é saboroso o meu francês

          Você quer conhecer o passado de Minas Gerais, quer saber como eram nossas terras, habitantes e costumes quando pouca gente morava em nosso Estado, quando nossas matas estavam quase intocadas, quando ainda tínhamos índios botocudos isolados na região do rio Mucuri e cada metro quadrado de nosso solo revelava novas espécies de animais e de plantas? Pois existe uma bibliografia razoavelmente extensa sobre esses primórdios, deixada sobretudo pelos viajantes europeus que aqui vieram após a abertura dos portos.
          Entre eles, está Auguste de Saint-Hilaire, botânico e naturalista francês que nos visitou entre 1816 e 1822, ao redor dos quarenta anos de idade. Culto, curioso, aventureiro, sem travas na língua, conservador como ele só, legou-nos observações saborosas, mesmo hilariantes, colhidas em suas numerosas incursões pelo país, do Rio Grande do Sul a Goiás. Elegeu, porém, Minas Gerais como sua província favorita. Admirava os mineiros, pessoas diligentes, trabalhadoras, honestas. Reservou palavras nada lisonjeiras para os paulistas. Esteve nas nascentes do São Francisco, cruzou a Mantiqueira, foi ao Distrito Diamantífero, conheceu o Jequitinhonha.
          Contou em detalhe quanto pagava pela comida, pela hospedagem, pelos serviços que lhe eram prestados. Coletou milhares de plantas, descreveu como e para que eram usadas e, precoce pirata biológico, enviou várias delas para a França e suas colônias.
          Para mim é sempre um choque reler sua derradeira anotação de viagem, datada de 1822, repleta de humor e precisão, quando Saint-Hilaire tinha quarenta e três anos de idade, enquanto, ao mesmo tempo, vejo no frontispício do livro seu retrato já velho, perto da morte. Um choque. O homem que, com vivacidade, falava comigo sobre o término da segunda viagem a Minas Gerais e reclamava da condição de nossas estradas, está enterrado há cento e sessenta anos.

          Eis a estranha magia dos livros: atravessam o tempo com seus personagens a tiracolo. Graças a eles, Saint-Hilaire não morreu e não permitiu que a memória da antiga Minas Gerais desaparecesse. Além disso, seu relato continua saboroso.       

terça-feira, 5 de maio de 2015

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Um professor desanimado

        Ele dá aulas há quase 30 anos em faculdades particulares. Está cansado. Não das aulas, mas da atual situação do ensino. Queixa-se dos alunos: buscam apenas o diploma. Define o problema com uma frase emblemática: "os alunos de hoje querem o diploma para esconder a incompetência". Não é preciso saber, é preciso formar.
        Quando ele começou a lecionar, havia maior interesse em aprender. Hoje, nem bem a lista de chamada é passada, a metade da sala vai embora. Em qualquer matéria. Afirma que apenas 10% dos alunos de fato se dedicam aos cursos. 20 %, mediante a persuasão, podem ser motivados e se tornar bons profissionais. Os 70% restantes são casos perdidos.
         Levanta uma hipótese aterrorizante. Tantos estudantes talvez não frequentem as aulas porque não conseguem entendê-las. Muitos leem os manuais e as apostilas e não os compreendem. São incapazes de redigir um texto inteligível. Cometem erros grosseiros. De fato, segundo as estatísticas do Instituto Paulo Montenegro, 38% dos formandos continuam analfabetos funcionais.
        As queixas também se dirigem à burocracia universitária. À caça de maior lucro, o investimento nos cursos é cada vez menor. Os salários seguem a tendência. Os mestres com maior experiência são dispensados, pois, em geral, recebem mais.
        O professor, que foi paraninfo no ano passado, confessa seu cansaço. E fracasso. Alega ter recebido uma educação mais adequada que a que hoje consegue oferecer. Por isso, não se aposenta. Quer reverter a situação. Tem esperança. Cada vez mais tênue. E o tempo escasseia.